Crônicas
O Peso do Fazer e o Esquecimento do Ser
Acordamos com pressa, dormimos com culpa. O tempo, esse senhor inflexível, nos arrasta como se fosse dono da nossa alma. Vivemos entre planilhas e postagens, entre tarefas e metas, entre agendas lotadas e cafés apressados. A vida, dizem, é movimento. Mas que tipo de movimento é esse que não nos permite parar? Leia também: A Medida do Fazer: Crítica e Complementaridade Na modernidade, a essência da vida foi sequestrada pelo fazer. Tudo gira em torno do produzir. Produzimos conteúdo, resultados, filhos, festas, memórias instantâneas — e esquecemos que viver não é uma função executiva. Tornamo-nos engrenagens bem lubrificadas de uma máquina que nunca para. O sistema nos sorri com dentes…
O Eu-angelho Segundo o Picadeiro
E subiram ao púlpito como quem sobe ao palco. Acenderam os refletores, ajustaram o microfone, e ao fundo tocava uma trilha sonora épica. Começa o espetáculo ao eu-angelho: o culto do coach ungido, do pastor mirim com milhões de seguidores, do influencer convertido na última live, devidamente batizado em águas digitais. A comunidade evangélica brasileira virou trending topic, e não foi por amor ao próximo, mas por devoção à próxima polêmica. A política foi elevada ao altar, onde o mandamento do amor cedeu lugar ao ódio justificado por versículos fora de contexto. Amar o inimigo? Só se ele votar certo. O resto é “guerra espiritual”. Enquanto isso, os púlpitos se…
O Mistério de Uma Teologia que Sangra e Canta
A teologia, por vezes, é sequestrada por laboratórios sem vida. É arrancada da terra molhada pela lágrima do pobre, da calçada onde dorme o esquecido, do altar improvisado da casa de um fiel que ora em silêncio diante da dor. Arrancada, embalsamada e colocada em vitrines douradas de academias onde o verbo não se faz carne, mas papel, rodapé e nota de rodapé. Tornou-se, em muitos círculos, uma ciência dos fósseis, um estudo dos ossos de Deus, como se o Eterno pudesse ser arqueologicamente escavado e catalogado por categorias humanas. Leia também: Teologia é para Gente Cansada Mas a teologia verdadeira… ah, essa não cabe em tratados nem se aprisiona…
Ovos, Coelhos e a Cruz: A Páscoa Aqui em Casa
“Coelhinho da Páscoa que trazes pra mim…”.Essa musiquinha infantil sempre me deixou embolado. Como assim coelhos trazem ovos? Tá, eu sei, já pesquisei, entendo a metáfora, o símbolo da fertilidade, da renovação e tudo mais. Mas mesmo assim, não me desce. Leia também: Jesus, Entre Dois Reinos: A Dança do Céu e da Terra A verdade é que, há tempos, essa comemoração virou só mais um evento capitalista — daqueles bem embalados pra vender chocolate caro. Aqui na cidade do interior, as lojas ficaram lotadas, gente correndo pra garantir seu ovo de Páscoa, como se a felicidade estivesse escondida dentro de uma casca de chocolate ao leite. Nunca gostei muito…
O Peso da Dor e o Silêncio dos Cúmplices
Há uma diferença abissal entre vitimização e a simples narração do sofrimento. Vitimização é quando alguém, de forma deliberada ou inconsciente, se coloca perpetuamente no papel de vítima para evitar responsabilidades, manipular situações ou justificar a própria inércia. Mas falar da dor que carregamos, nomear as feridas que nos marcaram, apontar os agressores que nos machucaram — isso não é vitimismo. É sobrevivência. Leia também: O Paradoxo do Desagradável Salvador Quantas vezes o grito do ferido é abafado pelo discurso fácil de quem nunca sentiu o mesmo corte? “Pare de reclamar”, “supere”, “isso é vitimização” — frases que, não raro, saem da boca daqueles que ou são os algozes ou…
Dia da Mentira: Entre Teologia e a Alegria Proibida
No princípio, era o Verbo. E o Verbo é a Verdade. Mas, em algum momento da história, alguém decidiu que a Verdade precisava de um dia de folga. Assim nasceu o 1º de abril, o Dia da Mentira (Mas será que foi isso mesmo?), uma data que, para alguns, é pecado; para outros, poesia. E, para muitos evangélicos brasileiros, é uma espécie de abominação moderna. Mas será que rir de uma mentirinha inofensiva é realmente tão grave quanto pregar fake news nos outros 364 dias do ano? Leia também: A Era das Narrativas e o Triunfo da Mentira Na Idade Média, dar risadas já foi considerado pecado. Sim, você leu certo:…