A Farsa Junina Evangélica

Compartilhe

A cada ano, com a chegada do inverno, o Brasil se enfeita com bandeirolas coloridas, fogueiras crepitantes e o aroma inebriante do milho verde. É tempo de Festa Junina, um momento para celebrar a fé, a família, a colheita e, claro, a cultura popular. Mas, para além da alegria contagiante e das comidas típicas, essa época também revela uma curiosa dicotomia: a farsa junina evangélica.

Evangélicos, em sua fervorosa fé, condenam a festa junina por suas raízes católicas e pagãs. Argumentam que os santos são adorados, que as comidas são oferendas a ídolos, e que toda a celebração é envolta em idolatria e sincretismo. Mas será que essa narrativa condiz com a realidade?

Os santos católicos, figuras veneradas por sua fé e exemplo de vida, não são adorados na festa junina. São homenageados por sua importância na história e cultura do Brasil, assim como figuras históricas e folclóricas são celebradas em outras culturas.

As comidas típicas da festa junina, como o bolo de milho, a canjica e o pé de moleque, não possuem nenhuma conotação religiosa. São pratos simples e saborosos, resultado da criatividade do povo brasileiro em aproveitar os produtos da colheita.

Ao negar a história e a cultura da festa junina, os evangélicos demonstram uma postura excludente e anti-dialógica. Ignoram que a festa, em sua essência, celebra a vida, a fartura e a alegria, valores universais que transcendem crenças e doutrinas.

Em uma tentativa de conciliar fé e cultura, surgem as festas substitutas: “Festa do Milho”, “Arraial Gospel”, “Festa da Roça”. Nomes diferentes para mascarar a mesma essência: a alegria da festa junina.

Essas festas substitutas, muitas vezes, pecam pela falta de autenticidade. São cópias pálidas da original, com decorações artificiais, músicas sem alma e um clima forçado de “fé em festa”.

Além disso, o sincretismo religioso é evidente. A mistura de elementos católicos, pagãos e evangélicos gera uma salada teológica que confunde e afasta os fiéis em vez de aproximá-los.

E por fim, o foco se desvia da fé para o entretenimento. Shows gospel, brincadeiras e comidas típicas tomam o centro do palco, enquanto a reflexão espiritual fica relegada a segundo plano.

Ao condenar a festa junina e criar suas próprias versões “hollywoodianas“, os evangélicos demonstram uma profunda insegurança. Negam suas raízes culturais, reprimem seus desejos de alegria e diversão, e criam uma falsa dicotomia entre fé e cultura.

Enganam-se ao pensar que estão sendo mais espirituais. Na verdade, demonstram estar aprisionados em dogmas que os impedem de viver a vida com plenitude.

A festa junina, em sua essência, é uma celebração da vida, da cultura e da fé. Negar isso é negar a própria história e identidade do povo brasileiro.

Evangélicos, em vez de condenar e tentar mascarar a festa, deveriam buscar maneiras de integrá-la à sua fé, reconhecendo seus valores positivos e adaptando-a à sua própria cosmovisão.

Afinal, a verdadeira fé não se traduz em repressão e negação, mas sim em amor, acolhimento e alegria. E a festa junina, com toda sua riqueza cultural e saborosa tradição, é um convite para celebrarmos esses valores com o coração aberto e a alma leve.

banner-ousia-ebook-teologia-newsletter

Quer o meu livro "Teologia de Pé de Pequi"? Inscreva-se para receber conteúdo e ganhe o livro em PDF diretamente em seu e-mail

Não fazemos spam! Leia nossa política de privacidade para mais informações.

banner-ousia-ebook-teologia-newsletter

Quer o meu livro "Teologia de Pé de Pequi"? Inscreva-se para receber conteúdo e ganhe o livro em PDF diretamente em seu e-mail

Não fazemos spam! Leia nossa política de privacidade para mais informações.

Compartilhe
Paulo Freitas

Paulo Freitas

Paulo Freitas é teólogo, filósofo, professor e presbítero. Autista, escreve sobre fé, fragilidade, dor, neurodiversidade e tudo o que nos torna profundamente humanos.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

The owner of this website has made a commitment to accessibility and inclusion, please report any problems that you encounter using the contact form on this website. This site uses the WP ADA Compliance Check plugin to enhance accessibility.