A Ilusão da Bênção: Teologia da Prosperidade e a Espiritualidade Superficial

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Lendo o livro de Karl Barth, “Carta aos Romanos”, deparei-me com uma citação intrigante: “O espírito servil de Hagar se exalta quando recebe alguma coisa, mas este é o caminho da expulsão” (Steinhofer). Barth, ao tratar da salvação, inclusive daqueles que não estão na igreja, nos alerta sobre a exaltação que pode acompanhar a recepção de bênçãos. Esta reflexão me leva a pensar em vários contextos modernos, especialmente no comportamento de certos crentes que vivem pedindo e, supostamente, exigindo milagres de Deus. Este fenômeno é particularmente comum entre os adeptos da Teologia da Prosperidade e aqueles que participam incessantemente de campanhas e petições.

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A Teologia da Prosperidade prega que a fé do crente pode trazer sucesso financeiro e físico, e que Deus deseja que todos os seus seguidores sejam prósperos. Este ensinamento, no entanto, distorce a verdadeira mensagem do Evangelho e promove uma visão utilitarista de Deus, como um gênio da lâmpada que existe apenas para satisfazer nossos desejos.

Jesus, em Mateus 6:33, diz: “Buscai primeiro o Reino de Deus, e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas”. Este versículo nos chama a priorizar nosso relacionamento com Deus e a buscar Sua justiça acima de qualquer ganho material. No entanto, a Teologia da Prosperidade inverte esta prioridade, colocando as bênçãos materiais como objetivo principal, com a justiça de Deus relegada a segundo plano.

A citação de Barth nos lembra que a exaltação resultante da recepção de bênçãos pode ser enganosa e perigosa. Quando recebemos algo de Deus e nos exaltamos, arriscamos seguir o caminho da expulsão, tal como Hagar. Em vez de humilhar-nos e reconhecer nossa dependência contínua de Deus, podemos nos tornar orgulhosos e complacentes, esquecendo que de Deus não se zomba (Gálatas 6:7).

Além disso, a exaltação pode levar à auto-justificação, onde começamos a acreditar que merecemos as bênçãos que recebemos e que, de alguma forma, nosso esforço ou mérito pessoal contribuiu para isso. No entanto, a Bíblia nos ensina que tudo o que temos é um presente da graça de Deus, e não algo que merecemos por nossos próprios esforços (Efésios 2:8-9).

Há também o perigo de tratar Deus como um fornecedor de desejos, sem reverência ou respeito por Sua soberania. Em Tiago 4:3, somos advertidos: “Pedis e não recebeis, porque pedis mal, para o gastardes em vossos deleites”. Este versículo destaca a diferença entre pedir algo segundo a vontade de Deus e pedir algo apenas para satisfazer nossos próprios desejos egoístas.

O verdadeiro relacionamento com Deus não se baseia na busca incessante por milagres e bênçãos materiais, mas na busca por Sua presença, vontade e justiça. É uma caminhada de fé e confiança, mesmo nas dificuldades e tribulações. Paulo, em Filipenses 4:11-12, nos ensina a estar contentes em qualquer situação, seja na abundância ou na necessidade, pois nossa força vem de Cristo.

Em conclusão, a exaltação que pode acompanhar a recepção de bênçãos é uma armadilha perigosa. Devemos ser cautelosos para não cair na ilusão de que nossa fé nos garante prosperidade material e sucesso. Em vez disso, devemos focar em um relacionamento sincero e humilde com Deus, buscando Sua justiça e confiando em Sua providência. Afinal, como nos lembra Gálatas 6:7, “De Deus não se zomba; pois tudo o que o homem semear, isso também ceifará”. A verdadeira bênção não está nas coisas que recebemos, mas na transformação de nossos corações e na profundidade de nosso relacionamento com o Criador.

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Paulo Freitas

Paulo Freitas

Paulo Freitas é teólogo, filósofo, professor e presbítero. Autista, escreve sobre fé, fragilidade, dor, neurodiversidade e tudo o que nos torna profundamente humanos.

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