A Dor que Fala: Uma Crônica de Fibromialgia, Depressão e Superação

Desde criança, a dor foi minha companheira, uma sombra constante que me assombrava em momentos inesperados. Lembro-me vividamente das noites em que a dor de dente me impedia de dormir, ou da agonia lancinante de uma infecção de ouvido que fazia meu corpo inteiro estremecer. No entanto, nada do que experimentei na infância poderia me preparar para a dor implacável que a fibromialgia traria mais tarde em minha vida.

O ano era 2019 quando fui diagnosticado com fibromialgia. No início, as dores eram suaves, quase suportáveis. Mas, como uma tempestade que se forma no horizonte, elas foram se intensificando, crescendo em força e persistência. Os medicamentos que me eram prescritos pareciam ineficazes, uma barreira frágil diante do avanço da dor. E então, vieram os anos de 2020 e 2021, o período mais sombrio que já vivi.

Era a época da pandemia de coronavírus, e é provável que o isolamento e a incerteza tenham contribuído para o agravamento do meu quadro. A dor não era apenas uma sensação localizada; era uma presença constante e pulsante, que ia do couro cabeludo até a sola dos pés. Não era uma dor estática, mas um latejar incessante que me impedia de encontrar qualquer alívio. Dormir sem ajuda de remédios tornou-se impossível, e com o tempo, a exaustão tomou conta de mim. Não havia posição confortável, não havia escape.

Em 2021, a situação se agravou ainda mais com a chegada da depressão. Perdi o apetite e, com ele, 9 quilos. Os cantos da minha casa se tornaram meus refúgios sombrios, onde me escondia do mundo, afastado do trabalho, da família, dos amigos. A fibromialgia havia me roubado a vida que eu conhecia. Já não conseguia brincar com meu filho, passear com minha esposa, participar das reuniões da igreja, nem dar aula. Tudo aquilo que antes me definia foi lentamente se apagando.

E então, veio o ponto mais baixo. Entre agosto e setembro de 2021, comecei a ter ideações suicidas. Esses pensamentos, que até então nunca haviam se insinuado em minha mente, surgiram como intrusos cruéis, planejando maneiras de acabar com a dor de uma vez por todas. Um surto me levou a correr pelas ruas, desesperado. Minha esposa, em desespero, correu atrás de mim, e conseguiu me alcançar três quadras abaixo de nossa casa. Foi então que percebi que precisava de ajuda.

Fui ao posto de saúde e pedi para falar com o psiquiatra. Ele ajustou os medicamentos para a fibromialgia e me receitou novos para lidar com a depressão. E, lentamente, muito lentamente, comecei a enxergar uma luz no fim do túnel. Minha mente começou a se limpar, as dores começaram a diminuir e a ansiedade, a ceder. A escala da dor, que antes atingia 9, começou a descer para 4 e 5. Hoje ela está controlada entre 2 e 3.

Hoje, olhando para trás, não posso dizer que gostei de passar por tudo isso. Mas também não posso negar que essa experiência me ensinou lições valiosas. Aprendi sobre a profundidade da depressão, sobre a escuridão dos pensamentos suicidas, sobre a dor que muitos enfrentam em silêncio. E, acima de tudo, aprendi mais sobre mim mesmo.

Agora, estou em um lugar melhor. Ainda há dor, mas ela não me define mais. Ela fala, mas eu também falo. E, pela primeira vez em muito tempo, sinto que posso viver novamente.

Perguntas para Refletir

  1. Como a dor, seja ela física ou emocional, molda nossa identidade e afeta nossas relações com os outros e com nós mesmos?
  2. De que maneiras o isolamento social, como o experimentado durante a pandemia, pode agravar condições de saúde mental e física, e como podemos buscar ajuda mesmo em tempos de distanciamento?
  3. Quais lições valiosas podemos extrair das experiências mais dolorosas de nossas vidas, e como essas lições podem nos ajudar a crescer e a ajudar os outros que passam por situações semelhantes?

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Casado com Janaína e pai do Ulisses. Tutor da Zaira (Chow-Chow) e do Paçoca (hamster). Escritor por hiperfoco e autista de nascença. Membro e presbítero da Igreja REMIDI e missionário pelo PRONASCE. Teólogo, Filósofo e Pedagogo em formação. Especialista em Docência do Ensino Superior e em Neuropsicopedagogia e Educação Inclusiva. Meus autores preferidos são: Agostinho, Kierkegaard, João Wesley, Karl Barth, Bonhoeffer, Tillich, C. S. Lewis, Stott e alguns pais da igreja. Meus hobbys são: ler, assistir filmes e séries.

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