O que NÃO se Deve Fazer na Campanha de Prevenção ao Suicídio

A campanha Setembro Amarelo, dedicada à conscientização e prevenção do suicídio, é um esforço vital para abordar um tema delicado e urgente. No entanto, muitas das ações realizadas em empresas, igrejas e escolas acabam cometendo erros que, longe de ajudar, podem agravar a situação de quem já está vulnerável. Prevenção de suicídio é uma questão que exige sensibilidade, seriedade e, acima de tudo, responsabilidade. O tratamento equivocado desse tema pode afastar quem mais precisa de ajuda e perpetuar estigmas que dificultam o enfrentamento do problema. Neste artigo, discutiremos alguns dos principais equívocos cometidos em campanhas de prevenção ao suicídio e o que pode ser feito para corrigi-los.

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1. Censura da palavra suicídio

Um dos erros mais graves nas campanhas de prevenção é a tentativa de evitar o uso da palavra “suicídio”. Em muitos eventos, vemos eufemismos como “passagem”, “triste fim” ou outras expressões que minimizam ou disfarçam a gravidade da situação. Esse tipo de abordagem é contraproducente. Precisamos chamar as coisas pelo nome, pois só assim será possível enfrentar o problema de maneira clara e objetiva. Esconder o termo suicídio sob camadas de palavras menos impactantes pode parecer uma maneira de aliviar o desconforto, mas, na verdade, apenas contribui para a desinformação e dificulta a busca por ajuda. Quem está lidando com ideias suicidas precisa de clareza, não de ambiguidade.

2. Tons festivos e desrespeitosos nos eventos

Infelizmente, é comum que eventos de prevenção ao suicídio sejam planejados como se fossem celebrações. Decorações com balões, distribuição de doces, danças e brincadeiras são, no mínimo, inadequadas. A realidade de quem pensa em tirar a própria vida é profundamente dolorosa, e eventos que tratam essa dor como algo leve ou trivial apenas afastam quem mais precisa de apoio. A seriedade do tema exige que os eventos sejam respeitosos e apropriados ao contexto. Seria impensável organizar algo assim se estivéssemos lidando com a perda de alguém próximo, e o mesmo princípio deve ser aplicado aqui. Balões e celebrações não são a resposta. O que se deve fazer é criar um ambiente seguro e acolhedor, que transmita empatia e compreensão.

3. Uso de frases de autoajuda e simplistas

Outra prática comum e problemática é o uso de frases motivacionais ou de autoajuda durante esses eventos. Frases como “Viver é a única e melhor opção” ou “A vida é bela” podem parecer inspiradoras à primeira vista, mas para alguém que está sofrendo e vê no suicídio uma saída, essas mensagens soam vazias e descoladas da realidade. Quem considera o suicídio não desvaloriza necessariamente a vida, mas encontra-se preso em uma situação de dor e desespero, onde a morte parece ser uma solução válida. Simplificar o problema com frases prontas e superficiais só reforça o isolamento dessas pessoas e a sensação de que ninguém as entende.

4. Detalhamento dos métodos de suicídio

Uma das piores atitudes em eventos de prevenção ao suicídio é discutir abertamente os métodos usados pelas pessoas que tentaram ou cometeram suicídio. Isso é absolutamente prejudicial e perigoso. A exposição a detalhes de como alguém tirou a própria vida pode incentivar quem está em situação de vulnerabilidade a seguir os mesmos passos. Por isso, é fundamental que nunca se fale sobre métodos de suicídio em público, nem se compartilhem fotos ou descrições gráficas. O foco deve ser sempre em oferecer ajuda, não em fornecer informações que possam ser mal interpretadas ou aplicadas.

5. Constrangimento e exposição de indivíduos

Outra falha comum em eventos é a tentativa de forçar pessoas que já passaram por experiências difíceis a falar publicamente sobre suas histórias. Isso pode ser extremamente invasivo e causar mais danos do que benefícios. É essencial respeitar os limites de cada pessoa e nunca pressionar alguém a compartilhar algo que não está preparado para discutir. O testemunho pode ser poderoso, mas deve ser voluntário e nunca imposto. O objetivo de qualquer evento de conscientização deve ser criar um espaço seguro e respeitoso, onde as pessoas se sintam livres para buscar ajuda sem medo de serem expostas ou julgadas.

6. Simplicidade e clareza: o caminho certo

Diante desses erros comuns, é importante que as campanhas de prevenção ao suicídio sejam reavaliadas e estruturadas de forma mais eficaz. Em vez de criar eventos elaborados, com muitos adereços e atividades, o ideal é focar na simplicidade e na clareza. Eventos simples, sem elementos festivos ou chamativos, são mais eficazes para criar um ambiente de seriedade e respeito. Não é necessário servir lanches ou transformar o evento em uma ocasião social. A prioridade deve ser sempre a informação e o suporte.

7. Convite a especialistas e distribuição de material informativo

Ao planejar um evento de prevenção ao suicídio, é fundamental contar com a participação de especialistas que compreendem a complexidade do tema e podem abordá-lo de maneira clara e séria. Psicólogos, psiquiatras e profissionais de saúde mental são os mais capacitados para conduzir essas discussões e fornecer informações adequadas. Além disso, distribuir folders informativos com números de ajuda, como o CVV (Centro de Valorização da Vida), e orientações básicas sobre como oferecer apoio a alguém com ideias suicidas é muito mais eficaz do que organizar atividades descontraídas.

Esses folders devem ser curtos e diretos, explicando de maneira prática como identificar sinais de alerta, como abordar a pessoa em risco e onde buscar ajuda. Mais do que frases motivacionais, as campanhas precisam oferecer informações úteis e acessíveis.

8. Foco no apoio e na rede de cuidados

Por fim, as campanhas de prevenção ao suicídio devem sempre reforçar a importância de uma rede de apoio. O foco deve ser em encorajar quem está sofrendo a procurar ajuda e em educar as pessoas ao redor sobre como oferecer suporte adequado. Uma frase simples, como “Você não está sozinho, busque ajuda”, pode ser muito mais poderosa e eficaz do que qualquer frase de autoajuda. O objetivo é criar uma cultura de empatia, compreensão e acolhimento, onde as pessoas se sintam seguras para falar sobre seus sentimentos sem medo de julgamento.

Conclusão

A prevenção do suicídio é um tema sério e complexo, que exige uma abordagem igualmente séria e cuidadosa. Evitar os erros comuns nas campanhas, como o uso de tons festivos, frases simplistas e a censura do termo “suicídio”, é essencial para garantir que essas iniciativas realmente cumpram seu papel de salvar vidas. Precisamos de eventos que tratem o tema com respeito, clareza e responsabilidade, oferecendo informações úteis e criando um ambiente seguro para quem precisa de ajuda.

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Perguntas para Refletir

  1. Será que os eventos de prevenção ao suicídio que participamos realmente acolhem quem está em sofrimento ou acabam afastando essas pessoas com abordagens inadequadas?
  2. De que maneira o uso de frases prontas e festivas pode impactar negativamente alguém que enxerga o suicídio como uma opção válida?
  3. Estamos criando espaços seguros e respeitosos para falar sobre suicídio, ou apenas reforçando estigmas ao minimizar o problema com ações desconexas?

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Casado com Janaína e pai do Ulisses. Tutor da Zaira (Chow-Chow) e do Paçoca (hamster). Escritor por hiperfoco e autista de nascença. Membro e presbítero da Igreja REMIDI e missionário pelo PRONASCE. Teólogo, Filósofo e Pedagogo em formação. Especialista em Docência do Ensino Superior e em Neuropsicopedagogia e Educação Inclusiva. Meus autores preferidos são: Agostinho, Kierkegaard, João Wesley, Karl Barth, Bonhoeffer, Tillich, C. S. Lewis, Stott e alguns pais da igreja. Meus hobbys são: ler, assistir filmes e séries.

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