Sobre o Estranho Preconceito

O mundo tem suas normas não escritas. São como linhas invisíveis que tecem o comportamento, o pensar, o existir. E, para quem não se encaixa nelas, sobra o rótulo: estranho. “Que menino estranho”, ouvi durante toda a minha infância. Era como se o que eu fosse tivesse algo de errado, algo que devia ser corrigido, ajustado. O tempo passou, os olhares e os sussurros ficaram. A sociedade, tão obcecada pela ideia de uma normalidade única, esquece que cada um de nós é um universo complexo e irrepetível.

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Curiosamente, ser chamado de “estranho” me fez pensar no que é ser normal. Não existe um padrão absoluto para isso, apenas a ilusão de que todos devem seguir uma mesma rota, quando, na verdade, somos viajantes de percursos únicos. Mas o que me impressiona é o quanto a palavra “autismo” parece ter se tornado alvo de desinformação. Dizer que “autismo está na moda” não é apenas ignorância, é desumanizar aqueles que vivem essa realidade. O diagnóstico de autismo, fruto de anos de estudo e observação por profissionais dedicados, não pode ser descartado como uma moda passageira. É um fato, uma existência, um modo de ser.

Entretanto, o que mais me espanta é o fenômeno das “pessoas comuns”, que de repente se tornaram especialistas em neurociência. A pessoa que nunca leu um artigo sobre desenvolvimento cognitivo ou sobre espectros neurológicos, que nunca ouviu o relato de alguém autista, agora se julga no direito de dizer quem é ou não é autista. Como chegaram a essa sabedoria repentina, eu me pergunto? Ah, claro, das “fontes” em suas cabeças, onde nasce a “estatística” absurda de que “50% da população é autista”. O que na realidade é uma mentira, visto que apenas cerca de 2% da população mundial apresenta o transtorno.

O que está realmente acontecendo é que a sociedade está sendo obrigada a encarar a neurodiversidade de frente. E isso assusta. Assusta porque desafia a velha noção de normalidade, de que todos devem caber em moldes pré-definidos. E é aí que os diagnósticos entram. Eles trazem à luz pessoas que sempre existiram, mas foram silenciadas ou marginalizadas por seu jeito de ser. Então, não, o autismo não está “na moda”. O que está acontecendo é que estamos, finalmente, começando a enxergar as diferenças com um pouco mais de clareza e respeito.

Mas, para quem vive sendo chamado de estranho desde a infância, a surpresa não é tanta. “Você é esquisito”, “Você não é normal”, frases que ouvi tantas vezes e que ainda ecoam. Mas o que me deixa realmente perplexo é a coragem que as pessoas têm de dizer isso na cara de outro ser humano. Como se houvesse algum tipo de glória em apontar a diferença alheia, em tentar diminuir o outro por aquilo que ele é.

Estranho, para mim, é essa falta de empatia. Estranho é o julgamento precipitado, a arrogância de pensar que sabemos o que se passa no mundo interno do outro. Estranho é viver num planeta com bilhões de mentes, e ainda achar que o único jeito válido de pensar e sentir é o nosso próprio.

Então, antes de julgar, de rotular, de descartar o diagnóstico de um profissional ou de minimizar a experiência de alguém, pense um pouco. O mundo é vasto, maior do que sua cabeça pode imaginar. E, sinceramente, há muito mais que você não conhece.

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Casado com Janaína e pai do Ulisses. Tutor da Zaira (Chow-Chow) e do Paçoca (hamster). Escritor por hiperfoco e autista de nascença. Membro e presbítero da Igreja REMIDI e missionário pelo PRONASCE. Teólogo, Filósofo e Pedagogo em formação. Especialista em Docência do Ensino Superior e em Neuropsicopedagogia e Educação Inclusiva. Meus autores preferidos são: Agostinho, Kierkegaard, João Wesley, Karl Barth, Bonhoeffer, Tillich, C. S. Lewis, Stott e alguns pais da igreja. Meus hobbys são: ler, assistir filmes e séries.

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