Origens e Diferenças: Pelagianismo, Semipelagianismo e Arminianismo

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No campo da teologia cristã, as discussões sobre a natureza do pecado e da salvação têm gerado intensos debates ao longo dos séculos. Entre as principais correntes que influenciaram essas discussões estão o pelagianismo, o semipelagianismo e o arminianismo. Cada uma dessas perspectivas oferece uma visão distinta sobre a condição humana e a necessidade da graça divina. O pelagianismo, proposto por Pelágio, argumenta que o pecado original não afeta a natureza humana e a salvação depende unicamente do livre-arbítrio e dos méritos individuais. Em contraste, o semipelagianismo, defendido por João Cassiano, reconhece a necessidade da graça divina para completar a salvação, embora acredite que o homem pode iniciar esse processo por sua própria vontade. Já o arminianismo, desenvolvido por Jacó Armínio, afirma a total depravação humana e a dependência absoluta da graça de Deus para a salvação. Este artigo explora as origens, crenças e diferenças entre essas três correntes teológicas, oferecendo uma visão aprofundada sobre como cada uma aborda a questão da graça e da condição humana.

Para uma visão diferente ler o artigo sobre Karl Barth: O Sim e o Não de Deus na “Carta aos Romanos” de Karl Barth

Pelagianismo

Origem e Desenvolvimento

Pelágio, nascido por volta de 350 e falecido aproximadamente em 423, foi um teólogo cujas ideias influenciaram profundamente o pensamento cristão. Seus escritos, inicialmente bem recebidos, foram posteriormente rejeitados. As principais doutrinas pelagianas sobre a natureza humana e o pecado podem ser resumidas em três pontos cruciais:

  1. Ausência de Pecado Original: Segundo Pelágio, os seres humanos não herdam o pecado de Adão. Ele acreditava que todos nascem essencialmente bons, sem a marca do pecado original ou a total depravação. Para Pelágio, cada pessoa é criada por Deus em uma condição similar à de Adão, podendo viver sem pecar através do livre-arbítrio, auxiliado, mas não necessitado essencialmente, da graça divina.
  2. Pecado pelo Livre-Arbítrio: Pelágio ensinava que o pecado é resultado do livre-arbítrio e não de uma natureza depravada. Embora os humanos tenham adquirido o hábito de pecar ao longo do tempo, essa inclinação não é herdada de Adão, mas desenvolvida por ações repetidas. Portanto, a humanidade não é corrompida pelo pecado original, mas sim influenciada pelos pecados das gerações anteriores.
  3. Mérito Humano na Graça e Salvação: Para Pelágio, a salvação é alcançada pelo bom uso da liberdade humana e pela fé em Deus, sendo a graça divina um facilitador, mas não essencial. A salvação depende, em última instância, da escolha livre do indivíduo de crer em Deus, tornando o homem responsável por sua própria salvação.

Essas doutrinas foram condenadas em diversos concílios, incluindo os de Cartago (412, 416, 418 d.C), Éfeso (431 d.C), Mileve (416 d.C) e Lião (475 d.C), principalmente pelos argumentos do bispo Agostinho de Hipona.

Semipelagianismo

Desenvolvimento e Crenças

O semipelagianismo surgiu como uma tentativa de encontrar um meio-termo entre as doutrinas de Agostinho e Pelágio. João Cassiano, um monge nascido em 360 e falecido em 465, é frequentemente creditado com a formulação desta perspectiva. As principais crenças semipelagianas incluem:

  1. Depravação Parcial: Diferente do pelagianismo, o semipelagianismo aceita a herança do pecado original de Adão. Contudo, acredita que esse pecado não corrompeu completamente a vontade humana, permitindo que o homem ainda busque a salvação por meio de seu livre-arbítrio, embora gravemente ferido. A graça preveniente de Deus não é necessária para iniciar o processo de salvação, mas é essencial para sua conclusão.
  2. Graça Secundária: No semipelagianismo, o homem pode iniciar o processo de salvação por seu próprio livre-arbítrio, e a graça divina intervém posteriormente para completá-lo. A graça é vista como uma resposta ao primeiro passo dado pelo homem em direção a Deus.

Assim como o pelagianismo, o semipelagianismo foi considerado herético, sendo condenado no Concílio de Orange em 529 d.C., que reafirmou a necessidade da graça preveniente para qualquer ação humana em direção a Deus.

Arminianismo

Origem e Doutrinas

O arminianismo, desenvolvido pelo teólogo holandês Jacó Armínio (1560-1609), difere significativamente tanto do pelagianismo quanto do semipelagianismo. As principais crenças arminianas incluem:

  1. Depravação Total: Armínio ensinava que o pecado original resultou na total depravação humana, tornando o homem espiritualmente morto e incapaz de buscar a Deus sem a intervenção da graça divina. A humanidade, em seu estado caído, não pode, por si mesma, pensar, querer ou fazer o bem verdadeiro.
  2. Dependência da Graça: Para o arminianismo, a graça de Deus é necessária do início ao fim do processo de salvação. Todos os seres humanos nascem em um estado de depravação total, necessitando da graça preveniente de Deus para serem atraídos e habilitados a crer e se arrepender. A salvação é completamente dependente da graça de Deus, sem mérito humano envolvido.

Conclusão

As distinções entre pelagianismo, semipelagianismo e arminianismo são profundas e fundamentais para a teologia cristã. Enquanto Pelágio e João Cassiano subestimam a necessidade da graça divina, Armínio enfatiza a total dependência da humanidade na graça para a salvação. Compreender essas diferenças é essencial para qualquer discussão teológica sobre a natureza do pecado e a salvação.


Bibliografia

  1. Maia, Carlos Kleber. Depravação Total. São Paulo: Reflexão, 2015.
  2. Mariano, Wellington. O que é a Teologia Arminiana? São Paulo: Reflexão, 2015.
  3. Nascimento, Valmir. Graça Preveniente. São Paulo: Reflexão, 2016.
  4. Oliveira, Ivan. Pelagianismo e Semipelagianismo. São Paulo: Reflexão, 2016.
  5. Olson, Roger. Teologia Arminiana – Mitos e Realidades. São Paulo: Reflexão, 2013.

Para saber mais:

Artigo: Distinguindo o Arminianismo Clássico do Semi-Pelagianismo | Deus amou o mundo! (wordpress.com)

Vídeo: Pelagianismo, Semipelagianismo vs Arminianismo – YouTube

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Paulo Freitas

Paulo Freitas

Paulo Freitas é teólogo, filósofo, professor e presbítero. Autista, escreve sobre fé, fragilidade, dor, neurodiversidade e tudo o que nos torna profundamente humanos.

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