A Era da Positividade Negativa

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Vivemos tempos estranhos, onde a felicidade parece ter se tornado uma obrigação. O sorriso estampado nas redes sociais virou regra, e qualquer sinal de tristeza ou desconforto é prontamente varrido para debaixo do tapete. As pessoas passaram a acreditar que a vida de todos, exceto a delas mesmas, é um mar de rosas, uma sucessão interminável de momentos felizes e perfeitos. É o que chamo de “positividade negativa”—um conceito contraditório que esconde mais do que revela.

Nesta era de aparências, a infelicidade, a tristeza, o sofrimento e até a morte se tornaram tabus. Não se fala deles, não se aceita que eles façam parte da vida. A busca pela felicidade constante tornou-se uma obsessão, e qualquer coisa que se oponha a esse ideal é vista como falha pessoal, fraqueza, ou pior, como algo a ser ignorado ou corrigido a qualquer custo.

E assim, muitos vivem aprisionados em um estado de hipocrisia, tentando aparentar uma felicidade que não sentem. Aqueles que não conseguem sustentar essa fachada acabam mergulhando em uma espiral de paranoia e desesperança. Passam a acreditar que a vida não tem mais sentido, que só eles sofrem, que estão sozinhos em sua dor. O resultado? Ideações suicidas que, em muitos casos, se concretizam.

Este fenômeno não atinge apenas adolescentes, mas também adultos e até idosos. A incompletude, o vazio de não conseguir ser “feliz o tempo todo,” leva muitos a crerem que não há mais saída. E as redes sociais só pioram essa situação, ao oferecer uma versão distorcida da realidade, onde todos parecem estar vivendo suas melhores vidas, o tempo todo.

Nas redes, vemos pessoas postando vídeos de sessenta segundos onde arrumam suas casas com um sorriso no rosto. Tudo parece tão simples, tão fácil. O que não se vê é o dia inteiro de suor, as lágrimas derramadas, a exaustão de quem passou horas tentando deixar tudo impecável para aquele pequeno clipe. Recebem uma chuva de curtidas e elogios, mas o que se passa nos bastidores, no cotidiano que é vivido longe das câmeras, permanece oculto.

Vivemos, portanto, em uma era de banalidades. O que é essencial fica escondido; só o superficial ganha destaque. E isso tem um preço alto, levando muitos à depressão e a pensamentos sombrios. Até mesmo entre os cristãos, jovens teólogos que aparentam uma sabedoria milenar nas redes sociais não estão imunes. Suas palavras são cuidadosamente preparadas para aquele momento, mas a verdade é que eles, como qualquer ser humano, também sofrem e enfrentam a dura realidade da vida cotidiana.

Precisamos entender que as redes sociais são apenas uma pequena fração da realidade—um pedaço, uma festa onde todos se arrumam para mostrar o melhor de si. Mas depois da festa, a vida continua, com seus altos e baixos, suas lutas e dores. E isso, quase ninguém posta. Porque, afinal, quem quer ver a realidade, quando a fantasia parece tão mais atraente?

Reconhecer isso é o primeiro passo para quebrar o ciclo da “positividade negativa” e permitir que a humanidade, em toda a sua complexidade, seja vista e vivida em sua plenitude. Só assim poderemos começar a aceitar que a vida é feita de momentos felizes, mas também de dor, tristeza e superação. E que tudo isso é parte do que nos torna verdadeiramente humanos.

Perguntas para Refletir

  1. Será que a felicidade constante que vemos nas redes sociais reflete a verdadeira vida das pessoas ou apenas uma fachada cuidadosamente construída?
  2. Até que ponto a pressão para aparentar felicidade pode estar nos afastando da aceitação genuína de nossos próprios sentimentos e limitações?
  3. Como podemos aprender a valorizar e compartilhar as realidades imperfeitas de nossa vida sem medo de sermos julgados ou considerados fracos?
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Paulo Freitas

Paulo Freitas

Paulo Freitas é teólogo, filósofo, professor e presbítero. Autista, escreve sobre fé, fragilidade, dor, neurodiversidade e tudo o que nos torna profundamente humanos.

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